
Campo da Convergência
Se há um país que sofreu as mazelas dos dois totalitarismos do século passado mais do que qualquer outro, esse país é a Alemanha. Passou alguns anos da primeira metade do século XX sob jugo nazista, e a maior parte da segunda metade sob jugo comunista. Verdade que apenas a metade leste do país ficou sob controle socialista após 1945, batizada, ironicamente, República Democrática Alemã (RDA).
Existe um lugar na Alemanha que representa, melhor do que qualquer outro na minha opinião, essa desgraça totalitária da qual foi vítima: Sachsenhausen. Criado pelos nazistas em 1936 na cidade de Oranienburg, da qual Sachsenhausen é distrito, a “Estação Z”, como era chamado o campo de concentração ali instalado, abrigou 204 mil detentos, dos quais 54 mil morreram por execuções ou maus tratos (algumas fontes chegam a apontar em 100 mil o número de mortes). Apesar de muitos judeus, dissidentes e outros terem sido mortos no lugar, a priori ele não era considerado campo de extermínio e sim um campo de prisioneiros comunistas. Era onde “treinavam” oficiais da SS antes de os enviarem para os tenebrosos campos de extermínio. O campo permaneceu ativo até abril de 1945, quando foi liberado pelo Exército Vermelho.
Em agosto de 1945 os soviéticos, que haviam preservado o lugar, resolveram aproveitá-lo para os mesmos fins – mas rebatizaram-no Campo Especial nº7/nº1. Para lá foram mandados membros do Partido Nazista, dissidentes comunistas, desertores do Exército Vermelho e uma miríade de infelizes que estavam no lugar errado na hora errada. De 1945 até 1950, 60 mil pessoas passaram pelo campo. 12 mil foram executadas ou morreram por maus tratos. Os sobreviventes foram mandados para Gulags no interior soviético. Buchenwald, outro campo nazista, teve o mesmo fim pelos soviéticos. Outros existem, com certeza.
Em 1990, depois da queda do muro, foram encontradas valas comuns no lugar e em 2001 o museu “Campo Especial nº1/nº7" foi ali criado. Em vista de que muitos campos foram transformados em museus e memoriais para lembrança nazista, ao menos um foi dedicado ao terror vermelho. Claro, houve represálias, pois, assim como no Brasil, a memória comunista alemã também é envolta em glória e esplendor – o passado negro deve ser esquecido ou justificado. A “Revolução Documental” ocasionada pela súbita queda do regime soviético só agora, mais de 15 anos depois, começa a fazer efeito.
Imagem: uma das torres do campo